19.2.09

Espetáculo

Observe o insano, rasgando a própria imagem no espelho
Vê como a verdade soa, vinda dele?
Debatendo-se como bicho engaiolado
Pensando que seria melhor não pensar
Olhos, razão, boca úmida
E visões contorcendo-se no ar
Visões por detrás de vapor do asfalto

Veja agora o imundo, vomitando sobre oferendas
Vê como desrespeita os deuses, o maldito?
Tropeçando sobre os próprios mantos
(Feitos de mentiras)
Tentando chegar sem se perder
Deuses, sentidos, fedor da rua
E canções perdendo-se no cantar
Canções por entre trilhas no mato

Vislumbre então o ganancioso, engolindo diamantes
Vê como se aflige em perder, o sovina?
Se perturbando em salvar uns grandes
(Que nunca bastariam)
Calculando tempo e cifra sem notar
Pólvora, calor, alguma sorte
E tiros punindo o tolo, devagar
Tiros por entre ilusões e o fato

Contemple ali a vadia, cuspindo promessas vazias
Vê como o falso ecoa nela, a vagabunda?
Esgueirando-se como cadela no cio
(Cheirando e lambendo)
Prometendo amar "sem se envolver"
Gemidos, perfumes, brilho da Lua
E gritos atravessando o luar
Gritos em meio ao puteiro barato

Não que melhores sejam os outros, mas aos poucos
Todo o espetáculo tolo se torna abstrato
Mas aqui ainda cabe desenrolar
Aquilo que chamamos loucos, bem poucos
São do mundo senão um retrato
Recortes de um álbum vulgar

Somos todos únicos na orquestra infinita
Notas perfeitas, harmonia, batidas
Insanidade, órfã da Loucura, perdida num temporal
Imundície, irmão de Ócio, habitante do Antigo Local
Ganância, pai de Cobiça, prima de Acidente Fatal
Luxúria, escrava dos ventos e de Vendaval

Somos todos amantes na sonata sofrida
Estamos todos na mesma orgia
De tons, delírios e luzes, chamada vida

Fecham-se as cortinas do real
Tudo volta ao normal
E o despertar se dá lentamente
Trancam-se as portas do real
E adormecer se dá totalmente
Quando mais nada parece existir
O espetáculo então, brevemente
Torna-se um pequeno elixir
Bebida mística da mente

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